O projeto Sésamo tem o objetivo de transformar em game as atitudes e comportamentos da população, definindo o quão bons ou maus os cidadãos são
por Renata Nunes 14 de maio de 2018
Se você gosta de ficar imaginando como a tecnologia influenciará o nosso dia a dia nos próximos anos – como os cargos que vão sumir no futuro –, provavelmente já deve ter assistido um dos seriados mais famosos e polêmicos da Netflix, o Black Mirror. A série britânica de 4 temporadas aborda de forma satírica e obscura a nossa sociedade, criando futuros distópicos que bagunçam a nossa maneira de encarar a vida. Apesar de ser uma série de ficção, o episódio “Nosedive” – primeiro da terceira temporada – está se tornando realidade do outro lado do globo, mas com aplicações bem assustadoras.
Neste episódio (calma que não vou dar spoilers), toda a sociedade é pautada pelo nível de popularidade que os usuários possuem em uma rede social, na qual as pessoas determinam o índice de aprovação das outras, dando notas de 1 a 5 para elas dependendo do quão satisfeitas ficaram com seus comportamentos e interações.
Da ficção à realidade
O governo Chinês, em parceira com a mais valiosa fintech do mundo, a Ant Financial Services Group, criou o projeto intitulado Sésamo (Sesame Credit), iniciativa que nasceu com o objetivo de transformar em game as atitudes e comportamentos da população, definindo o quão bons ou maus os cidadãos são.
Não à toa, o nome Sésamo foi inspirado no conto árabe “Ali Babá e os Quarenta Ladrões”, uma clara referência ao grupo Alibaba, dono do site de compras internacional Aliexpress e da fintech que desenvolveu tal projeto.
Assim como no episódio de Black Mirror, por meio de um sistema de pontuação chamado “crédito social”, este projeto mede e ranqueia o comportamento das pessoas em relação à obediência ao governo Chinês, coletando dados da população de forma massiva e irrestrita. Tudo o que é comprado, todos os sites navegados e publicações nas redes sociais do país é monitorado. Até mesmo câmeras de vigilância estão sendo utilizadas para identificar infrações como atravessar a rua fora da faixa, por exemplo.
Então, se você postar fotos sobre a favor da oposição ou comentar sobre a queda na economia, você automaticamente perderá pontos. Já se você compartilhar links sobre como a porcentagem de empregos aumentou e der preferência para produtos fabricados no país, você ganhará pontos.
E se você já acha que as bolhas criadas pelo Facebook são prejudiciais para a qualidade de informação que recebemos diariamente, o projeto Sésamo vai além. O sistema avaliará a qualidade de suas amizades. Ser amigos de pessoas que não são “amigas do estado” fará com que você perca pontos, praticamente obrigando que os chineses se isolem em bolhas de informação pró governo.
Prêmios e punições
Os pontos conquistados neste “jogo” serão utilizados pelo governo Chinês para fornecer vantagens ou punir as pessoas com verdadeiros boicotes.
Cada cidadão contará com uma pontuação básica entre 350 e 950 pontos, que estará associada ao documento de identidade chinês, a qual será modificada em tempo real, através de um aplicativo que computará as infrações que a pessoa cometer.
Do acesso a vagas de empregos e escolas à emissão de documentos e permissões de viagens internacionais, tudo ficará atrelado à posição em que o indivíduo estiver no ranque. Pode ser que por atravessar fora da faixa de pedestres em um dia, você perca uma vaga em um hospital no outro, ou que tenha um empréstimo recusado por ter comprado uma revista em quadrinhos japonesa.
Ou seja, ser um mau jogador pode ter consequências gravíssimas, já que não temos ideia do quão profundo será este controle.
Desde 2014 o projeto está em fase de testes, permitindo que a população chinesa acesse e utilize o sistema de forma voluntária. Contudo, é previsto que ele se torne mandatório até 2020.
E aí, o que você acha? É ou não é muito Black Mirror?
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